EU E ELA

Faz uma semana que eu estava pensando no que dizer, como fazer algo que a convencesse a prestar atenção em mim. Como alguém que, numa noite chuvosa numa estrada antiga e escura, chacoalhando os braços para os fachos de luzes que passavam velozes e deixavam apenas os respingos de barro e lama.

Ninguém nunca parou nesse estrada antes, ainda que tivesse sol, imagina se com chuva. E eu absorto nos meus pensamentos, nas minhas poucas ideias originais que despertassem certo interesse, ah, meu velho poeta, não soube ver que o peixe fisgado era eu, quem chacoalhava na rede dela.

Ela – que deixou isca tão boa e palatável, trazendo seu doiradinho à armadilha – plantou-me delícias à vista, e eu, pensando que perguntava, respondia. Como um naufrago sonhando afogado com um navio distante e ele a bradar, acorda nos braços resgatado do mar. Ah, se não fora seus lábios!

Demorei-me a me dar conta do mundo. Quando caí em mim, já não era eu apenas ali. Passei a semana inteira a meditar nos fatos recentes. “Quem imaginaria que numa segunda-feira em Boituva…” Eu ainda assim teimava em me boicotar. Queria justificar a todo custo o meu fracasso. Estava entregue.

Eu, agitado colibri, fui apanhado por suas dóceis mãos. Fiz-me cativo em seus olhos, na sua doçura, na sua delicadeza, na sua belezura. Vi meu futuro em seu colo, em seus seios, meu leito, meu mundo. Vi que há beleza ainda a descobrir. Eu, das filosofias e dos pensamentos, fui atropelado pelos sentimentos. Não sairei incólume dessa corredeira. Arrebatado, mas cônscio de cada sonho que junto, eu e ela, começamos a tecer.

SE EU ME CASASSE

Se eu me casasse com você
Não viveria ao seu lado,
Deixaria que você vivesse
E iria cuidar do seus filhos
Se eu me casasse com você.

Se eu me casasse com você
Eu me mudaria, iria viver noutro lugar,
Quiçá noutro mundo;
Quem sabe longe de tudo?
Não mais seria tão noturno
Se eu me casasse com você.

Se eu me casasse com você
Me preocuparia apenas com sexo.
Te deixaria sofrer preocupada com minha ausência,
Sofreria do lado de fora,
Sentado debaixo da janela
Ouvindo seus soluços,
Se eu me casasse com você.

Se eu me casasse com você
Seríamos só memórias e lembranças.
Faria o tempo não passar para nós,
Ninguém acreditaria quando nos visse
Tão sós, tão distantes, tão juntos.
O sol seria obscuro, soturno – sórdido;
O outro é que seria a paz
Se eu me casasse com você.

Se eu me casasse com você
Ninguém nunca saberia o que era um o que era dois;
todos saberiam que éramos nós.
Ou como se perguntava hoje de manhã:
Híbrido de mim, onde está você?
Eu não saberia ser sem ser contigo,
Seria dois em um só umbigo,
Um outro travestido de minhas vontades,
Repleto dos meus desejos,
Alocado, escancarado das minhas intenções:
“Minha nobreza se foi, ficou só as roupas do rei.”,
Se eu me casasse com você.

Se eu me casasse com você
Jamais precisaria me casar novamente.
Seja você aqui ou do outro lado,
Eu viveria pra sempre marcado
Como meu pai marcou minha mãe;
Como ela me fez marcado
Eu a mim mesmo marcaria, sou teu,
E teu seria até o fenecer do dia.
Antes daquelas brigas todas
E ainda mais depois de todas elas.
A gritaria, os tapas e o amor entre tudo.
Não teríamos fim, onde eu terminasse começaria você
E vice-versa como versa o vice,
Se eu me casasse com você.

MALDITAS

Ah, como eu as amo, essas malditas!
Vivo delas
E delas me aproprio e divulgo-me,
Nelas me deleito, me engasgo,
Tenho gozo, tenho asco.

Faço as invejar das notas
Até que eu as uno
E as reformulo num verso só.
Ritmo, rimas e sons!

Delas me desculpo,
Mas nem lembro se me arrependo.
Se as deixo ir é mais por necessidade.
Elas me levam junto, aonde já não iria mais.

Se não as uso bem
É por que são malditas.
Dizem de tudo, o que devem
E o que não devem, até mesmo na omissão.

Revelam pela fartura e pela escassez!
Desnudam pela presença
E na presença da ausência,
Desvelam-me também.

Essas minhas companheiras!
Ainda que as deixo de lado,
Revira e volta, há sempre um dia
Em que as faço valer as minhas intenções.

CINZAS

Acendo o último,
Sem demoras, sem explicações.
No meu pulso corre frio,
O último fio de sangue nas veias.

Parece que foi ontem,
Breve momento, trocas de olhares,
Palavras soltas sem muitos sentidos.
Busquei-lhe a noite toda.

Acendo o naco de pavio restante
Pra queimar as sobras.
Agora, já queria que fosse cinzas.

Mas a chama aparenta-se mais viva.
Ardendo e incendiando.
Eu a queria fugaz,
Mas havia palha demais para o alastro.

E FOI-SE

O Vento passou.
A chuva passou.
Ficou o céu sereno sem nuvens,
o mormaço escaldante.
E a vida dilacerava os dias aos dias
e o tempo ao tempo
e o medo ao medo.

Restou desesperança,
insucesso, não-êxito, desgraça,
destempero, ódio seco, a estagnação.

Onde foi parar os momentos, memórias,
que escapando ladeira abaixo, desmoronando, foi-se?
Quais folhas, arbustos, pudera segurar-se?
Quem, a si, salvar-se?

Passou!
O vento e a chuva e o céu e o calor
e os dias e o tempo e o medo e os momentos
e as memórias e a ladeira e o morro e as folhas
e os arbustos e quem mais pudera.

E foi-se embora!

FELIZ 12

Enfim, novo ano! Novas oportunidades. Renovo!

O ano 12 é um ano de possibilidades, onde um horizonte de coisas se apresentam. Basta escolher.

Uns casarão, outros mudarão de emprego, de vida, de cônjuge, de cidade, de país. Encontros e despedidas se darão. Problemas serão solucionados, dando lugar para novos desafios e oportunidades. Para muitos a esperança findará, para muitos se multiplicará.

Ano 12, doze meses e muitas outras histórias para contar. Tristes e alegres, boas e ruins, todas nos marcarão, nos ensinarão, levarão parte de nós, nos trarão novos trejeitos e manias, cada qual a seu modo. Histórias.

O meu desejo é que no meio de todo esse emaranhado de vidas, momentos, possibilidades que se apresentam, que se abrem diante de nós, não falte nunca espaço para estarmos gratos!

Grato, satisfeito, reconhecendo em todas as coisas e em todo o tempo, tudo aquilo que merece ser louvado. Expressar a satisfação de estar vivo e vivo desfrutar das possibilidades de modo intenso, verdadeiro e único (pois acredite, cada respirada singular jamais será de novo).

Esse é o ano que eu vislumbro e é assim que eu quero nele estar: Grato!

É O OUTRO!

Vi, como um bom bisbilhoteiro da vida alheia, uma frase, um comentário sobre quão egocêntrico os jovens hoje se apresentam. Por infelicidade, ou por descuido, também comentou-se, que nós – aqueles que não somos egocêntricos – sofremos ao vê-los tão dispersos, olhando apenas para seus próprios umbigos.


Pensando sobre esse egocentrismo do outro, a única coisa que vi, foi a mim mesmo; tão egocentrico que de tanto olhar para o meu umbigo, acreditei que ele fosse o outro. Assim vi a mim em todos aqueles que para mim não era apenas eu mesmo.


Pensando nessa salada toda, descobri algumas coisas sobre mim: que seria bom se todas as minhas ações para o próximo fosse sempre em prol do outro; ás vezes, o que eu faço para o próximo é mais por querer ser efetivo com aquilo que creio que sou, que por está diante do outro, me dispondo e me abrindo para o outro.


Vivemos uma busca por entendermos de fato quem somos. Mesmo que não seja algo “na cara”, ou uma pergunta que de fato vem à nossa mente de forma tão óbvia, quem eu sou?, mas de diversas formas estamos tentando acreditar que somos algo, ou tentando provar, ou sermos aceitos pelo que somos. “Se somos, somos, isso é o que importa”, diria o cantador (Seu Lega Gaspar).


Mas se ser é o que importa, não importa quando somos, por que se ser (quando sou) é motivo de orgulho para mim diante dos outros, como a criança do “eu tenho, você não tem”, talvez não sejamos de fato. Ser e ter que provar o que se é o tempo todo, talvez seja por não-ser. Ser só teria sentido enquanto estou sendo. Talvez ter que ser, é deixa de ser para que o outro seja. A linguagem atrapalha muito aqui. Está sendo quando não há preocupação em ter que ser, mas apenas em que o outro seja.


O que quero dizer de fato é que enquanto não me abro para o outro, tanto à Deus quanto ao próximo, não sou capaz de ser. E quando falo abrir-se para o outro, quero que a ênfase esteja no outro. Mais uma vez esbarro-me na linguagem, mas o outro enquanto outro mesmo, não outro mesmo de mim, mas o outro que não sou eu, que é diferente, que é estranho. É permitir que alguém mais seja (o outro seja), que não eu mesmo. Não ser, ou não ter que ser, me ajuda a ver o outro, como ele é, e não como eu acho que tem que ser.


O ser só pode ser enquanto se é. Se tiver que se questionar sobre o que se é, talvez não seja. Como diria Deus a Moisés, Sou o que sou, e eu complemento, quando sou, e como sou o tempo(?) todo, pode me chamar apenas de Eu sou! Deus é, então Ele não se questiona sobre o Ser dele. Mas o ser que somos nós, o tempo todo pergunta pelo ser, pelo seu sentido, pela sua razão de ser. Talvez por que o seu sentido esteja naquele que é de fato e verdade. Aquele que é tudo em todos!


Quando alienamo-nos de Deus, ficamos tateando buscando ser alguma coisa, anulamos o outro, por que precisamos ser, ansiamos por ser. Ao alienarmo-nos de Deus, no alienamo-nos do outro também, por que eles apenas vão nos mostra o que não somos.


Agora Deus é tão bom que mesmo tateando nós podemos o encontrar, no mundo, na vida, na natureza, no outro. Mas temos tanto medo da responsabilidade de ser, que não sendo vemos isso (o não-ser) apenas naquilo que chamamos de outro. Acho que pode parecer loucura, mas ansiamos por novamente poder dizer como Jesus dizia, quem vê a mim, vê o Pai. Por que isso, estando no Pai, naquele que É, o Eu sou, nEle eu vou sendo e vou deixando o outro ser.


Um coisa que percebo em Jesus, é o quanto ele permitia que o outro fosse. Aparentemente, ele não determina quem o outro é apartir dele mesmo, de suas experiências e do seu tato; antes, permite que o outro seja. Talvez, por isso mesmo que ao aproximar de um cego, um coxo, um leproso, ele perguntava: “o que quer que eu faça, o que você quer de mim?” Por que apesar de ser mais um doente, era um outro doente. Apesar de que todos os leprosos, poderiam querer a cura, aquele próximo leproso, era um outro leproso, diferente do anterior, diferente do próximo, e diferente principalmente de mim, de Jesus, diferente de cada um de nós.


Acredito que olhar como Jesus, ou com os olhos dEle, seria olhar para o outro, como outro. Não como eu gostaria que o outro fosse, mas como ele é. É aceitar o outro, é querer o outro por perto, por que é outro. É não aceitar mais que seja o mesmo de mim e sempre considerar que o outro é outro diferente mesmo, apesar de muitas coisas iguais!


É aceitar que o outro tem limites, que não são os mesmos para todos, mas são diferentes para cada um. Sendo, um outro um próximo, o desafio está dado, cada próximo meu é um outro diferente. E preciso ver, lidar e relacionar com a realidade de que cada próximo é um outro e é um diferente e é um desafio e é uma aventura e é uma descoberta e é uma vida.


Somente pela graça de Deus, que me permitir estar nele, para ser e deixar ser. Como disse meu amigo Stutz, bastasse reconhecer que somos (ou que não somos) e nos entregar nas mãos do Único que pode nos transformar. Transformação essa que acontece quando eu me abro pra Ele, me abrindo para o outro.

FALTA DE AMOR VERSUS FALTA DE AMIZADE

Pessoas que conheço curtiram uma frase com a dualidade acima. E declararam a vitória da falta da amizade sobre a falta de amor, no assunto ruína de relacionamentos e casamentos. É falta de amizade e não a falta de amor que arruína relacionamentos! Dogmático e categórico.


Fico pensando sobre essas duas questões que se apresentam. Acho dificil escolher uma delas, e equacioná-las com relacionamento. Muito amor, muita amizade é sinonimo de bom relacionamento? Falta amor, muita amizade, idem? Muito amor, pouca amizade significa ruína e por aí vai?


Gostaria só de pensar um pouco sobre o que é amor, e o que é amizade. Sabendo que, dificilmente vamos esgotar e determinar tanto um quanto o outro. E com isso não quero desmerecer o mérito da frase proposta e de sua intenção, mas apenas ponderar sobre os limites dela. E acredito que, amor e amizade são elementos essenciais para bons relacionamentos, e para mim, a falta de qualquer um deles, dentre outros, é ruína para um relacionamento.


Eu queria pensar numa faceta do amor para considerarmos melhor sobre o mesmo: o Altruísmo. A capacidade de sair de si, para dignificar o outro. Ou a inclinação para obter o bem para o próximo. São Paulo, escrevendo sobre o amor, fala sobre isso, que o amor não busca seu próprio interesse. É dificil falarmos sobre esse ponto, quando o assunto é relacionamento amoroso, por que os amantes estão sempre buscando o seus próprios interesses no outro, o que precisa mudar. Mas no casamento, essa busca pelos próprios interesses deveria transformar-se de busca dos meus para ao menos na busca dos nossos interesses, ou na sastisfação de saber que os interesses do outro suprido supre os meus. Vê como é imprescindível apenas um dentre vários aspectos que o amor é.


Dizem sobre a amizade, sobre o amigo, que é aquele que apesar dos seus defeitos, continua gostando de você, outro poeta diz que amizade não se faz, mas se descobre. O que mais me encanta na amizade é que através dela, você se descobre amando. Ela é o ambiente melhor para se amar, principalmente o amor dos amantes, por que é onde eu escolho o outro sem a menor necessidade do outro, até que eu decida necessitar dele.


É por essa razão que não consigo pensar na equação acima. Sem amor, não existe possibilidade de amizade. Sem amizade, no relacionamento amoroso, o amor perde o sentido. É quase impossivel um relacionamento sem a possibilidade de ambos, amor e amizade, o tempo todo. Um dos desafios para o cristão é de amar seu inimigo, pois é o esforço para desenvolver o amor num ambiente totalmente desfavorável a ele. O que apenas demonstra que a ruína nem sempre é necessária.


Concordo com alguém que disse acerca do verdadeiro amor. O amor está ficando banalizado, mas não o amor verdadeiro. E talvez, o que arruína um casamento, um relacionamento, não seja tão fácil de se escrever em alguns caracteres. Às vezes, queremos respostas fáceis para a vida, mas a vida é complexa demais para uma resposta muito simplista assim. Talvez, o que arruína a nossa vida, é vivermos ela de maneira rasa, pouco autêntica, banalizando-a, querendo torná-la fácil e barata. Viver é caríssimo, meu caro, e todos os seus desdobramentos (relacionamentos, familia, trabalho, vocação) idem!